sábado, 29 de dezembro de 2007

Tempestade de Verão


A distância que nos separa tão cruelmente,
É o corte mais profundo em minha derme.
Mais um recado no vazio em outra insólita madrugada,
Passa das seis da manhã e uma minguada luz começa a preencher a escuridão.
Pensamentos soltos que buscam sempre o seu semblante.
A sombra da saudade alimentada pelos ponteiros do relógio.

Pilhas de trabalho sobre a mesa e uma canção ecoando pela minha mente,
A profundidade dos sentimentos é resgatada na fria tempestade dos trópicos,
Tantas perguntas que ficaram no ar,
Tantos desejos guardados entre o calor dos lábios,
Tantas lembranças correndo minha mente,
A vida é um saco de memórias e algumas lágrimas.


Quantas noites em Sol buscando um único pensamento?
Quantas palavras exauridas engolidas com a saliva?
Quantos dias em pressão profunda em borda de medos indeléveis?...
A vida perambulando em branco e cinza,
As cores fugiram junto com os seus passos,
Galgo cada degrau da escada que desço até a profundidade do que restou dos sentidos.


Se soubesse por um momento o quanto do cálice amargo que é servido aos meus olhos,
Certamente entenderia que a vida vai muito além das fobias e devaneios,
A curta vida entre o meu Amor e sua (des)razão,
A solidão que nos priva de um sorriso mais vindouro,
A canção que soa latente pelos seus ouvidos é o meu canto platônico de apelo:
- Não ceife na raiz o triste podar de nossa estrada!


Passam as folhas do calendário,
Risco os dias para não lembrar do silêncio,
Nenhum festejo comercial ilude meus olhos,
Nenhuma palavra sai dos meus lábios colados,
Toneladas atrozes sobre meu peito,
Joelhos flexionados até o chão...


Não ignore o calor dos meus dedos entre suas mãos,
Não sele com temor os lábios que tanto foram unidos com os meus,
O verão possui a frieza dos dias lacônicos de inverno,
O suor desliza sobre meu corpo com pequenos blocos de gelo,
O inverno de verão é tão cinza quanto à imprecisão dos dias,
O vento e a tempestade levam a cada dia uma pequena gota d´água da minha face...

quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

A linha tênue



Rasgam-se os dias incertos,
Nem sempre na mesma tempestuosa clemência,
Do espectador à espera de sua liberdade diante do corredor da morte.

Enlouqueço ou silencio?
Quando a porta não se abre,
Os dias, velhos dias, são quase todos pardos,
Na espera quase fleumática,
A saliva seca no meio do deserto,
Da poeira trazida pelo chão casto,
Dos momentos de tortuosa expectativa...

Enlouqueço ou respiro?
Eis a dúvida de cada manhã insólita!
Nada faz amenizar os dias de angústia.
Cárcere cinzento com a jaula para os sádicos,
Roncam os dias de labuta e latência,
O suor desliza gelado pela espinha,
Os dedos tremem ao observar os ponteiros do relógio,
Nada é dito sem olhar as estrelas,
Um silêncio absurdo absorve o Tempo,
Não existe azul no céu,
Apenas nuvens turvas e sem brilho,
Hoje é triste!...
Amanhã também!
Caminho na linha tênue entre a cor e o verniz.

Enlouqueço ou regurgito?
O que se passa no semblante,
Dos olhos da amada?
Nunca sei ao certo,
Apenas posso ter uma vaga idéia,
Dos esconderijos e das inquietações,
Que apavoram seus olhos,
Jazem no silencio dos lábios castrados,
Todos os segredos enegrecidos entre trevas.

Enlouqueço ou penitencio?
Até quando a espera saciará os lábios desejosos de chuva?
Até quando a luz que cega seus olhos ilumina os caminhos mais simples?
Até quando seus pés caminharam distantes da palma de minhas mãos?

Enlouqueço ou pereço?
Não há lábios que calam minha ânsia,
No horizonte hostil entre o azul e o negro pálido,
A vida desdenhada não encontra Paz,
Sem um lampejo de voz,
Nada ecoa diante dos corações partidos.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Em silêncio... (Canção para um Amor Maior)


“O teu silêncio é uma nau com todas as velas pandas...
Brandas, as brisas brincam nas flâmulas, teu sorriso...
E o teu sorriso no teu silêncio é as escadas e as andas
Com que finjo mais alto e ao pé de qualquer paraíso...”
(Fernando Pessoa)



Em silêncio, estou a pensar
sobre tudo que rodeia meu cerne:
angústias e aflições,
temores e esperanças,
um microcosmo desfalecido.


Em silêncio, sinto o valor dos desejos
tangíveis a minha mão
deslizando pelos meus dedos,
como lava incandescente
incinerando minha alma.


Em silêncio, sufoco o latejar da dor
batendo deliberadamente em meu peito
o triunfar da melancolia
permeia o meu vazio ser,
assolando meu coração.


Em silêncio, o fino aço de sua mordaz apatia
delineia sobre o meu pulso marcas
escorrendo meu vital líquido,
liqüefazendo-me a cada instante
que Você povoa a minha mente.


Em silêncio, numa manjedoura escuridão
procuro incessantemente pelo brilho de seu olhos
luz que meu coração deixou-se seduzir
caminhos de tempestuosidades inegáveis
rios de desolação em profundas turbulências.


Em silêncio, sinto saudade do beijo
que nunca tive oportunidade de lhe dar,
perdido em desertos escaldantes
confesso a angustiada espera
pelos nuances do oásis lábios seus.


Em silêncio, fico a imaginar
se seu Amor existe,
se não é apenas um infeliz palpite
ensejo que até a Lua acredite
mas, até agora, tudo é tão triste!...


Em silêncio, embriago-me sem cessar
em delírios subjacentes,
incertezas mórbidas,
um penar inaudível
como o ressurgir de mais um dia acinzentado.


Em silêncio, é preciso ser
mais rápido que a fugaz luz
para vencer a solidão de me conduz
procurando esquecer o semblante que seduz
o brilho opaco que sua ausência produz.


Em silêncio, malogrado estou
pelas vãs tentativas de lhe alcançar.
Ah, imponderável Amor, musa desta insipiente toada
circunavego em mares indissolúveis
preso pelas veleidades incessantes deste teu olhar,
desvairar meio de lhe amar!


Em silêncio, temo em acordar
e pensar que tudo pode ser fantasia,
devaneios de um lírico desbotar
como a pétala de uma rosa caída ao relento
impulsionada pela dor de um severo vento,
silenciosamente pairando no chão a desencantar.


Em silêncio,
acendo parafina,
teço uma prece,
fecho meu corpo,
limito a minha voz,
aprumo minhas mãos
pedindo ao Criador que me abandonou
o sublimar de um pequeno Amor
deste seu adiabático coração,
acendendo um vil lampejo
nas trevas desta ingrata solidão!


Em silêncio,
estou a calar,
estou a naufragar!
Mas não importa,
nada, nada importa!
Apenas quero lhe ajudar,
quero que a felicidade sempre sorria para Você!
Assim como o meu desejo
que sorrias para mim!
Neste instante,
a tristeza há de cansar...
Cansado estou eu!...
Cansado meu coração está...


Em silêncio,
busco em pensamentos
perguntas sem respostas,
dores em afagos,
pranto sem lágrimas...
Quais são as palavras
que alvejam o seu coração?
Qual é o mistério
que tenho que fazer velar
para poder mais lhe agradar?
Quanto tenho que silenciar
para que possa me ouvir?
O que preciso fazer
para que seu sorriso seja apenas de felicidade,
uma singela felicidade,
que lhe faça realmente feliz?


Em silêncio,
quero gritar bem alto
para que todos possam sentir meu clamar
e saber que é possível ouvir
tudo o que tenho para dizer...
Desta forma, Você também ouvirá:
Olha, não é preciso esforço.
tão pouco sacrifício,
apenas deixe-se ouvir,
ouça a si mesma...
Ouça!...
Ouça as palavras que silenciosamente
procuro transmitir!
Ouça o meu silêncio,
que em silêncio procuro lhe dizer:
Deixe-me tocá-la sem temor...


Em silêncio, meu desejo é sempre estar com Você!
Minha alegria é sempre quando posso lhe ver,
minha tristeza é quando seus olhos
se ausenta de meus olhos,
meu devaneio maior é o encontro se seus lábios
com os meus lábios...
Minha fobia maior é quando tudo apagar
o meu faz-de-conta terminar
e nunca mais lhe encontrar...


Ouça o silêncio de quem sempre lhe amou!..
Em silêncio!...

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Claridade (Olhos bem fechados)


Busco seus olhos,
Como o lamento preso ao cárcere
Em busca de libertação...
Ser livre da mordaz fobia,
Ser livre da atroz solidão,
Ser livre da angústia do não-viver...

Busco seus olhos,
Como quem busca o sorriso,
Um riso,
Um simples sorriso,
Quase sem graça...
Quase sem dor...
Quase sem alegria...
Um sorriso tão tímido,
Quanto a timidez diante do seu olhar...

Olhos que queimam,
Olhos que devoram,
Olhos tristes...
Olhos tenros, ternos...
Simples como uma pétala,
Simples como uma brisa a beira-mar,
Simples como a luz...

Olhos que castiga,
Olhos que oprime,
Olhos que deprime,
Olhos que me encanta e condena,
Penar o seu amor...
(Penar é o que faz aquele
Que se liqüefez por seu olhar...)
Olhos que intriga a razão,
Olhos que amordaça a lucidez,
Olhos que freneticamente busco,
Aproximar do seu lânguido brilho...

Ah! Quanta sede tenho,
Destes seus olhos esmeraldas,
Quero me saciar deliberadamente
Em seus olhos cristalinos verdejantes...
Quero a luz...
Quero a luz de intensidade ímpar,
Proveniente de seus olhos,
Simples como o brotar da manhã,
Simples como o queda de uma gota de orvalho,
Simples como o céu...

Tragam-me seus olhos,
Por favor, esta sede me sufoca,
Esta sede escurece minha visão,
Esta sede que inebria minhas ilusões,...

Olhos! Tragam-me estes seus olhos de brilho infinito,
Olhos que clarificam o espaço,
Iluminam minha solidão,
Iluminam as trevas em meu coração...

Não quero desfalecer!...
Sedento aos seus olhos,
Não quero morrer sem saciar minha sede...
Quero mergulhar em seus olhos,
Naufragar em sua claridade,
Saciando-me de felicidade eterna...

Doce claridade,
Que a cegueira dos seus olhos,
Não obscureça a luz radiante da nostalgia,
Presente na retina dos meu olhar,
Sem jamais esquecer o intenso brilho do caminho,
Que hoje os olhos fecham para tudo ao redor.

Luz, que faça a luz!
Claridade que ilumina e afugenta os medos!

Que ilumine as mãos como um farol,

Onde quer que esteja,
Nunca feche os olhos...

Sem luz não há vida,
Sem luz não há claridade,

Sem a sua luz, tão pouco é iluminado aqui...

domingo, 16 de dezembro de 2007

Concepções


Datas! O que são datas?
Marcos referenciais inúteis,
Ou lembranças destemperadamente fúteis?
Não! Não podem ser marcadores de páginas,
Não podem ser tinta ao livro de visitas,
Não se diminuem em registros hieroglíficos...
O que dizer então do Natal?
A panacéia da caixa-registradora tilintante?
Falso escambo entre pessoas?
Feridas em metástase?
O Natal é tudo o que pensar,
E é muito mais do que o imaginário materializar...

Volúpia ou louvor,
Veleidades ou necessidades,
E há quem desacredite em tudo isto!
Então, qual é o sentido de uma data assim?
O Natal não é uma simples data
É um estado transubstancial,
Que aufere ao crente a bênção do Senhor,
E respinga no descrente o respeito do símbolo.

Não há como ficar indiferente,
Se o Natal fosse apenas uma simples data,
Então, precisaríamos criá-la!
Não pelo seu fetiche que lhe é intrínseco,
Mas para vingar uma semente de humanidade
No leito de pedra que enverniza o coração humano...

O Natal não é apenas uma data,
Uma data pode significar um Natal!

sábado, 15 de dezembro de 2007

Louvação (Lúdica Toada)


"Para que cantarei nas montanhas sem eco
As minhas louvações?
A tristeza de não poder atingir o infinito

Embriagará de lágrimas a minha voz".

(Vinícius de Moraes)



Quando meu Bem resolver
Descer de seu inatingível pedestal
Irei ao seu encontro.
Com um sorriso extático,
Uma rosa na mão
E uma lágrima na face
Estenderei meus braços o máximo possível...
Minhas cambaleantes pernas seguirão a luz esmeraldina,
Em sua direção, a cada passo dado
Será um latejar de felicidade em meu coração
E a cada centímetro que aproximar
Será uma chaga fechada
Em meu peito circunavegado de marcas indeléveis.


Ah, doce Ninfa!...
Quando resolver colocar a maciez de seus pés neste solo,
Onde os mortais são secularmente dilacerados,
Como o joio que sufoca o vindouro trigo,
Tempestade silenciosamente suicida,
Personificação do febril inferno de Dante...
E sob a noite que encobre a pálida solidão
Estarei a lhe buscar...
Em delírio, observarei estaticamente sua face,
Esboço pueril do brio que despoja minha alma...
Caso tiver sido digno de seus olhos,
Repousarei minha mão em seus dedos cor-de-algodão
E, sonoramente, recitarei ao seu ouvido:
“Eu te amo!”

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Dialética (Uma canção sentimental)


Você pode me fazer chorar,
Você pode me fazer sofrer,
Você talvez dirá que nunca me amou,
Mas o meu amor por você,
Nunca entenderá, nunca saberá o por quê,
Porque nem mesmo sei ao certo
O que causa esse amor,
O amor por você!

Toda paixão digna de nome,
Reside no fato de coexistir uma grande sinceridade!...
Sinceras são minhas palavras
(Por que não acredita nelas?),
Sinceras são minhas canções
(Por que não alveja o seu coração?),
Sinceros são os meus sentimentos
(Por que não crê no meu amor?)...

Não há razão!
Não há razão para o amor,
Não há razão para penar,
Não há razão para encontrar
Alguém para ter como par,...
(Há razão na paixão?...)

Será um imenso favor
(Já dizia uma antiga canção),
Gostar de alguém?
Será que a razão
Ressoa mais alto que uma paixão?
Talvez a razão possui algum sentimento,
Encrostado no peito,
Em segredo,
Um eclipse oculto pela própria natureza,
Qual a razão para o amor?

Querer um beijo,
Um desejo que não tem cura?
Se a razão nos encurta as emoções,
Destoa nossas cândidas ações,
É preferível,
Logo então,
Viver com a razão
A nunca ter uma paixão?

Como um invisível escudo sentimental,
Quem pretender blindar-se na lógica da fleumática razão,
Jamais conhecerá o que é o amor!
Razão e paixão,
Uma dialética que malogra o coração,
Desfigura as ações,
Cala o silêncio,
Escurece a solidão...

Amor e humor,
Rimando com claustrofobia, dor e ardor,
Será que algum dia,
De tanto caminhar errático sem orientação das setas,
A encruzilhada conhecerá o fim?

domingo, 2 de dezembro de 2007

(In)transparências (ou Mentiras sinceras, verdade corrompida)


A verdade está lá fora?
Quem sabe esquecida dentro de alguma gaveta?
Em algum lugar onde não sei mais buscar,
Debaixo de uma pedra ou fincada no leito de um rio,
Sobrevoando arranha-céus em desfilando em becos,
Na vala de um córrego ou velada pelas lágrimas de algum cemitério,
Na areia recheada de penachos dos galos de uma rinha ou na batalha insana do trânsito,
Pairando em cima de um telhado ou sendo levada pela correnteza de alguma chaminé.
Incinerada por uma fornalha ou sedimentada por um desmoronamento após as águas de março,
Na boca disforme de um leproso ou nas mandíbulas de um chacal.
Nunca chegamos a real verdade,
Dúbia, passional e fosca,
A verdade é um caminho conduzido pela fé dos mortais.
A verdade tem propriedade ou será um bem coletivo?
Qual o seu preço na bolsa de apostas?
Quem sabe se aproximar de onde a verdade está?

Quais os passos que levam a minimizar a distância,
A verdade entre os seus e os meus lábios?
A verdade que ninguém sabe ao certo,
A verdade que nutre tantas ansiedades.
Envolvemos-nos com tantos dilemas e postulamos nossos horizontes,
Por que não conduzimos nossas vidas observando o próprio interior?
Onde a verdade está? – eis a sempre alucinada questão.
Qual a trilha verdadeira a peregrinar?
Ninguém sabe?... Talvez ninguém tenha razão.
Cada gesto é um olhar impessoal,
Particular de cada alma açoitada pelo Tempo,
Cada artifício jorrado pelas palavras em desavenças,
Nada indica que chegaremos o fio da verdade,
Nada poderá conduzir uma estrada sem dolo.
Nada vai salvar as almas condenadas pelas próprias mãos.

Quem é o dono da verdade?
Quem é o criador que conhece seus sortilégios?
Quem acredita que exista uma única verdade?
A verdade impregnada em cada um de nós,
Nutrida por cada sílaba acre de sangre,
Podada pelas intempéries do destino particular,
Jazigo abreviado do longo martírio dos dias em descanso.


Recorde para o que há dentro de sua alma,
Quais os dias mais felizes que possa fazer lembrar?
Quantas verdades absorvidas de sentimentos reais?
Quantas palavras deixadas de lado para nenhum propósito?
Quantos olhares que se perderam na trilha fechada da indiferença?
Ao sabor dos ventos é deixada a vida fluir,
Sem rumo ou direção,
No limite profano entre a alegria e a insensatez,
Mãos em derrotas, joelhos dobrados rente ao solo,
A janela que se fecha guardando algumas verdades,
A voz rouca de tanto querer dizer verdades,
A saliva que secou engolindo poucas verdades,
A verdade das fobias.
A verdade dos infames.
A verdade dos canibais.
A verdade dos insanos.
A verdade dos lunáticos.
A verdade dos enfermos.
A verdade dos solitários.
A verdade dos embriagados.
A verdade das alcovas.
A verdade das alcoviteiras.
A verdade dos crentes.
A verdade demente.
A verdade que tanto mente...


A mentira cansada de ser pregada como verdade se transforma na própria verdade.

A verdade escancarada,

A verdade necrosada.

A verdade tão errônea,

A verdade esquecida.

Certo ou errado?

A verdade é uma pedra quase nunca lapidada.

sábado, 1 de dezembro de 2007

O avesso


Quando as palavras findam,
Um vazio extensível acampa a retina,
O frio que assolava as madrugada de inverno,
Presenteia com a sua severidade em dias de Sol a pino.

Tanta calmaria não faz renegar a verdadeira face,
Dentro do espaço circunscrito dos anseios,
Pulsa a intensa sinergia da constrição,
Noite e dia, pensamentos vagam sem morada.

O avesso do vazio é a profundidade dos sentidos,
A febre que se perde em insensata aversão,
Tão súbito quanto o cair de uma tempestade,
A chuva de granizo que fortifica tanta ansiedade.


O avesso do Amor é a indiferença,
Jazigo das palavras fragmentadas e inertes,
Interrompe-se o zelo dos olhos unidos em sintonia,
Ampliam-se as margens da lacônica distância.


O avesso do sonho é a treva,
Lateja no peito uma mácula de profunda dor,
Atinge na derme um corte hostil,
Sangue em pequenas gotas de um rio de indiferença.


O avesso da música é o estrondo,
Que zune a toda hora e em cada pesadelo,
Que não permite o trafegar de um sono mais tranqüilo,
Fiel marca-passo da insônia.


O avesso da alegria é a tragédia,
Sela a alegria contagiante dos lábios,
Nutre com pavor os dias de expectativa,
Ceifa sem dolo as mãos unidas em pranto.


O avesso da liberdade é o cárcere,
Trancafiado na jaula da apatia dos antigos sentimentos da pele,
O grito que não ecoa entre as montanhas da inquietude,
A privação dos desejos contidos no chão tão fértil das mãos atadas.


O avesso do sexo é a castração,
Interrompe o potencial do desejo,
O clímax tão perfeito é deixado do outro lado da ponte,
O sabor da saudade sedenta e morta na boca.


O avesso da notícia é o silêncio,
Prisioneira do fardo das horas,
Castigada pelas veleidades do medo,
Cansada da luz que incomoda na escuridão.


O avesso de Quixote é Pilatos,
A labuta do cavalheiro tangido pelas ilusões e assombrações,
A nefasta presença da covardia imersa na bacia d´água,
Os moinhos de vento vão além de meras abstrações do imaginário.


O avesso da terra é o pântano,
Pés deslizando no ópio das angústias,
O segredo da vida cedendo a liberdade para o lamento,
Os dias tristes sendo alimentados à exaustão.


O avesso da esperança é o adiamento,
Cansando os nervos e não cicatrizando as batalhas,
A estrada das lágrimas avança quilômetros a cada recuo,
Os caminhos cruzados se ampliam na luta diária da vitória interditada.


O avesso da hora é a morte,
Sinalizando o limite da ação na palma do desconforto,
O farol sinalizando o fim da viagem,
O céu carregado de fel desabando de tanta frustração.

O avesso do avesso,
É a manutenção da perplexidade exercida pelo
status quo sentimental,
Quando o orgulho ingênuo domina o clamor dos lábios,

E paira no ar, a derrota fratricida de corações atados pelos uivos da muralha.