domingo, 19 de setembro de 2010

Exaustão (Psicografia Cotidiana)


Bem ao certo diria sem pestanejar,
Nada se sabe com precisão por longa data,
Se a força incide com ímpeto em dado momento,
Nada poderá ser dito para os atos em futuro além.

Há um desvario que transcende a razão,
A perfídia dos sentidos não inspira confiança,
Olhar desbravado para a exterioridade do berço,
Os pés não descolam do frio leito do cativeiro.

As bobagens são atiradas como fetos indesejados ao solo,
A crueldade patente dos que não acreditam na vida,
A esperança é um título de livro de auto-ajuda,
Entre os dedos há um odor de pólvora.

Uns lutam com idéias, outros pelejam com sangue,
Mentir é sempre muito mais fácil do que ceder,
Trair é voluntariamente mais sedutor e operante:
Ganhar, ganhar, ganhar sempre e unilateralmente.

Racionalizar as emoções como se elas fossem meros axiomas,
Crava-se no peito alheio a indiferença banal e fortuita,
Acumular a materialização da vida como uma inútil rota da prosperidade,
Uma Bíblia na mão e uma oferta para a igreja dos usurpadores da fé alheia.

No viés de suar onde muitos lutam pelo pão,
Espalhados como areia, os desejos viram cascalho e poeira,
A opressão se torna tão banal como o anoitecer,
A letargia engole o poder de indignação.

Futuro incerto, cotidiano previsivelmente insosso,
Calhar de tudo parecer tão pragmático quanto irredutível,
O mecanismo asséptico da vida no retorno à moda de Comte,
Correr, exaurir e ainda contracenar o escárnio no YouTube.

O desvelo da vida é a descoberta de si,
O vácuo esquecido no indecifrável inconveniente,
A dor de fixar os olhos no espelho de Lacan,
Nada é tão doloroso do que próprio reflexo do Eu.

Na vacância da sobriedade, sobra então regurgitar a cegueira,
Quem não vê, não tem o que refletir,
O sonho burocrático é como a sorte na roleta-russa,
Apesar do iminente fracasso, não custa aplaudir a mesmice!

Entre mentiras involuntárias e ilusões pueris,
Aglutinam-se cada vez mais seres num mesmo fragmentado microespaço,
Uns arrotam pluviosidade do vernáculo com palavras efêmeras e vazias,
Outros fazem de tudo para justificar o sadismo sob o rótulo de "civilização".