domingo, 21 de outubro de 2007

Brumas de Outono


O desejo transforma o que não tenho,
O desejo reduz o que não sou,
O desejo que oprime e se faz sentir
Na carne,
Na alma,
Nos olhos de quem não há mais o que penar,
Porque já penou demais!

O real já se desfez,
A utopia, mesmo convalescente, ainda resiste...
Em berços caudalosos de triste caminho,
De viver o que nunca viveu,
E pairar como folhas mortas,
Em uma solitária manhã de outono,
Em névoa, em lágrimas...

O que foi para ser dividido
Foi negado!
E o que foi negado,
Jamais será compreendido!
Na desrazão do Ser
Calam-se os que possuem vozes inaudíveis,
Calo-me sabendo que minha insípida voz
Não atinge os seus ouvidos...
E de desassossego vou me confinar
Até o fim do dia,
Quando as estrelas começarem a brotarem
E a claridade morrer...

Há um mar de desejos,
Insólitos, inatingíveis...
Na solidão do dia,
Há até mesma uma solidariedade da chuva,
Que ao molhar minhas vestes
Ameniza o desalento da saudade.

Distante em trevas...
Brumas de outono,
Brumas de incompreensível razão,
Brumas de angústia visão...

Apenas brumas,
Assim como o desejo de tê-la,
Assim como o desejo de tocá-la,
Assim como o desejo de amá-la,
No silêncio,
No impossível,
No infinito em névoa...

Meditação



Escuta, pois, e presta atento ouvido,
não a som harmonioso,
mas ao ruído
que sai do fundo deste amargo peito,
tangido por delírio imperioso,

para meu gozo e para teu despeito.

(Miguel de Cervantes, Dom Quixote de La Mancha)



Se o Amor
É um doce martírio
Que nos afoga na amálgama de sofrimento e ardor,
Então por que vivo a querer viver de ilusão?
A ilusão do Amor,
É como o sucumbir das mágoas de um coração,
A verdade é sedada,
Guardada ao pé da cruz.
Com a ilusão minguada de felicidade,
Vivo a buscar a face de um sorriso feliz,...

Musa do meu cantar,
Não seria mais justo neste dia,
Lembrar com apreço e ternura
Olhos que encanta e inspira
Esta pálida sinfonia?...

Talvez nunca seja minha,
Nem por isso há de desbotar
A escrita de meus versos em vã harmonia.
E caso a dúvida ainda rondar seus sentimentos em tormenta,
Neste mundo desvalido,
Urgido pelo capital e emoções de fúteis neologismos,
Procure compreender que minha verborrágica oratória
Não é apenas um recital insípido de uma só nota,
É o meu grito afônico clamando o seu nome!

Se o velho fidalgo Quixote,
Ansiava deliberadamente encontrar a sua vítrea Dulcinéia,
Por que nos passos deste cavaleiro andante,
De figura triste e coração casto, não poderei seguir?
Abençoado é aquele que não se redime
Com a avareza da alma dos malditos
E o escárnio dos tolos...
Enturvado pelo mundo,
Sua lucidez suprime a loucura mundana dos espectros,
E a sua emergente peregrinação por liberdade,
Condicionada no semblante da amada,
Converge na procurar incessante de sua razão para viver.

Não pleiteio seu nobre coração,
Com a demagogia de quem outorga
Cínicas palavras desmedidas,...
Apenas ofertá-la com minha lira,
Breves em sua consistência
Mas singularmente longa em sua sinceridade.

A cada hora partida,
A cada sutil lembrança divagando na mente,
A cada momento que o verde dos seus olhos vem a tona,
É uma saudade acrescida em meu coração!...

Quem sabe um dia,
A infelicidade de tão infeliz
Deixe de ser tristonha,...
E quem sabe ainda,
Neste dia,
Você acreditará em minhas canções,
Responderá ao meu apelo
E dirá que confia em mim!
Daí então,
Não irá pairar dúvidas:
Seremos felizes também!

Contemplação do Amor (Poema tirado de um trecho de jornal)



Eros.
Ardor.
Ilusão.
Flores.
Humor.
Desejo.
Afagos.
Utopia.
Cupido.
Êxtase.
Agonia.
Volúpia.
Paixão.
Ternura.
Afrodite.
Tolices.
Timidez.
Devoção.
Lágrimas.
Panacéia.
Bucolismo.
Sacrifício.
Abstração.
Adoração.
Dedicação.
Voracidade.
Fugacidade.
Compreensão.
Cartas de amor fadadas ao ridículo?
Durar enquanto o infinito permitir?
Sentidos da Paixão?
Imortalidade?
Amor
?




Então,
porque não,
Você e Eu?

Requiém autofágico



Talvez em algum dia,
Quando a névoa zarpar,
Quando o medo naufragar,
Quando o tempo passar
Desapercebido de nossas vidas,
Encontraremos respostas que acalente nossa razão.
E talvez neste impávido momento,
Brotarão as lágrimas que relutamos não ceder a vida inteira
Aos inevitáveis apelos da razão...
Talvez perceberemos que a aurora límpida
Que saciávamos encontrar avidamente,
Nunca existiu e nem promessa de seu canto de sedução jamais permeou a realidade...
Se o destino rege alguma atividade probabilística em nossas vidas
Certamente, o seu domínio é fugaz e insipiente.
O destino é apenas a tradução vindoura de nossos mais orgânicos desejos presentes!

Há algumas verdades na vida,
Tão essencialmente intrínsecas e latentes,
As quais passam translúcidas no suceder dos dias,
Raramente refletidas ou sentidas,
Sem ao menos percebermos a sua mensagem...
A vida nunca é racionalmente coerente,
A vida nunca é a imediata transposição dos sonhos,
A vida nunca é completamente o transbordar da íntima alegoria,
A vida simplesmente é a transfiguração que propomos a si mesmos,
A aridez de uma alma em espinhos,
A tenacidade de desejos altruístas,
A volúpia de quimeras ditosas,
A sagacidade da busca eterna do saber.

Se a felicidade existe um fim,
Seria um fim em si mesmo.
Quando desejamos não a encontramos,
Quando encontramos não sabemos ao certo se é, tão somente, projeção surreal...
Até descobrimos, tardiamente, que sua face era bem natural...

A vida é um martírio no qual não sabemos a sua sentença,
Talvez se soubéssemos a sua penitência,
Não haveria sentido a sua existência...

Angústia


Será que é sempre assim?
Buscar, buscar e nunca conquistar,
Ansiar, ansiar e nunca encontrar,
Procurar, procurar e nunca chegar,
Sangrar, sangrar e nunca coagular,
Penar, penar e nunca findar,
Balbuciar, balbuciar e nunca explanar,
Lamentar, lamentar e nunca realizar...

Quais são as palavras mais certas para lhe fazer ouvir?
Qual é o canto?
Qual é a tempestade?
Qual é a oração?
Qual é o pranto?
Qual é a verdade?
Qual é a redenção?
Qual é a saudade?...
Qual é a vida que não carrega uma dor?

O choque desmedido entre o impávido querer e o inócuo fazer,
restam apenas vãs migalhas,
um punhado de lembranças
e a tenaz etérea tristeza do não-conseguir.
Busco fomentar a angústia d’alma
com a tênue visão de singular horizonte
e o cálice de Sócrates proveniente de tão alucinógeno desejo.

A personificação do Amor,
não se restringe a mero devaneio,
obscuro titubeio ortográfico,
na pálida devoção do querer.
Ultrapassa os limites da crítica razão,
a Ciência se reduz a um discurso anacrônico,
a volúpia já não se destingue do ceticismo.
A razão já não é razão,
é desrazão alucinadamente lírica,
alucinadamente quase felicidade,
alucinadamente quase alegria...

Irrequietos sentimentos,
Onde a angústia não se encarcera...

Albacora (A canção de Cananéia)


“Tudo só para os olhos!
E nos olhos um ritmo,
Uma cor fugitiva,
A sombra de uma forma,
Um repentino vento
E um naufrágio infinito.”
( Octavio Paz )

A onda leva,
Anda a passos rítmicos,
Bailando ao pôr-do-sol.

No mar,
O azul-turqueza
Se confunde com a lembrança do prisma
Avassalador dos seus olhos esmeraldinos...
A saudade flua
Como a proa do meu chão,
Refletindo o seu esboço,
Suavizando o cansaço,
Solidificando o ensejo,
Segregando a angústia,
Como um barco em alto-mar,
Cortando águas espumadas ao redor.

Lá fora,
Onde o que era mundo,
Tomou a escuridão para si.
Onde o que parecia ser o infinito,
Não é nada além
Que o finito do meu ínfimo barco.
O mundo passa então do infinito horizonte,
Ao limitado convés,
Onde finco meus pés.

A solidão é tamanha!
É não é maior,
Quando o silêncio é sondado
Por fragatas a planar,
Golfinhos a mergulhar,
Cardumes a nos visitar,
E a sonora insensatez do motor a girar
Quebrando a morbidez do limbo.

A onda anda,
A onda ressoa,
Uma afinada canção,
Amálgama do vazio oprimido,
É oriunda da flutuante ação das águas,
Conduzindo uma gélida brisa persiste em minha face.
E a cada movimento do solo
Nos remete a desagradável sensação de insegurança.

Na dimensão da existência humana
Somos quase nada,
Somos limítrofes em nós mesmos!
E quando penso nesta fronteira íntima,
Busco procurar lhe dizer,
Para fazei-la entender,
Que minha dedicação por Você
É como a plenitude das águas
Ao sabor das correntes,
Ao sabor da força dos ventos,
Ao sabor da energia das ondas...

A cada minuto,
Uma hora...
A cada hora,
Um dia...
Os dias são longos,
Como um olhar de adeus!...

Velejar é qualquer coisa
Semelhante aos reversos da vida!...


(Em Cananéia, litoral Sul de São Paulo, bem longe da costa e participando de uma expedição promovida pelo IO-USP a bordo do barco Albacora, 21/07/98)

sábado, 20 de outubro de 2007

Eclipse



Não consigo pensar em nada que difere do passado.
Fico dias,
semanas,
meses...
Procurando uma resposta para questões mal formuladas.

Eis, a grande e derradeira questão:
Não consigo elaborar a pergunta
que tanto anseio resposta.

Sinto angústia com esta inércia mental.
Segue então uma circular procissão:
Penso,
penso,
penso...
Pensamentos
que não chegam a lugar algum!
Reflexões de um inexorável vazio.

As idéias são de um capricho único.
Teimam em ascender-se,
massacrando seu interlocutor
sob a forma mais vil possível.

Pasteur e seu apelo às mentes preparadas.
Fico com o apelo às mentes persistentes.
As danadas não caem do céu,
muito menos são pulgas.
Então,
porque não aparecem
quando mais necessitamos?

E, quando aparecem,
(quando aparecem!)
precisamos domá-las com cautela:
Formulamos
hipóteses brilhantes,
teorias espetaculares,
teses incríveis...
Mas, mesmo assim,
podemos estarmos,
desastrosamente,
ERRADOS!

Não posso desistir,
tenho que resistir!
Preciso manejar a paciência,
e não contar com a esperança.
Ser conduzido com este guia
- a tal Esperança;
é se deixar perder em
melancolia,
frustração,
depressão.
(Ironicamente, apesar disto,
é a única companhia que tenho.)

Pobre...
é aquele que não é beneficiário da sorte,
carente de perspicácia,
subproduto de um intelecto frágil e fragmentado,
ignorante das lições do passado,
míope das ações do presente,
estúpido em relação ao futuro,
e têm, como mártir, a famigerada esperança...

Logo,
sou um mendigo...
Perambulando por um vácuo cerebral,
regido por uma crença quase irracional,
fustigado pelo Tempo,
abatido pela apatia...
Conviver com a triste condição
de ser um humano,
um simples e mortal
HUMANO.

Dependente de uma outra condição:
a de produzir e promover
meus parcos pensamentos.

A ilha

Será que nunca chorou
No escuro silencio do seu quarto?
Será que nunca sufocou
A lágrima que ansiava pairar sobre a face?
Será que nunca sentiu o coração apertar
E lembrar que ninguém ousou penetrar na sua alma?
Ou será, acreditar
Que o País de Alice,
Fica a partir da porta do seu quarto?

Na solidão que tenta fingir,
Fugir para não pensar,
Pensar e buscar se enganar...
Seus demônios engrandecem a sua alma?
O inverno lhe aquece?
No verão sente frio?
O brotar das flores,
Envaidecem a sua primavera?
E o cinza das ruínas de outono,
Ofertam a sua felicidade?
Se Você acreditar estar bem: Parabéns!
Talvez se sinta melhor,
Logrando a sua tristeza!
Talvez acredite nesta felicidade,
Coagulada em seu peito,
Congelada com suas fobias,...
Petrificada em sua mente!
As glaciações não lhe trazem pavor?

Se sente a falta da razão,
Tanto quanto sinto a ausência de sua iluminação,
Então, não espere, não demore!...
Estarei aqui!
Se buscar refúgio,
Abrigo encontrará!
Se buscar um muro,
Uma muralha (tijolo a tijolo) erguerá!
Se buscar esquecer da dor
Despoja-se de suas amarras,
E dividiremos seu tormento,
Minimizando seu sofrer...

Ninguém é uma ilha,
Mesmo uma ilha sempre terá a companhia
Na noite em trevas, a Lua...
No escaldante luz, o Sol...
Na morna penumbra, as Nuvens...
Cada um cortejando-a de finita distância,
A infinita margem que os separam!...

Estarei sempre aqui!
Enquanto não chegar,
Esperarei até o fim da minha vida...
Talvez um pouco mais,
Mas, esperarei...
Até Você chegar!...

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Castigo


Deixe-me ir
preciso andar
vou por aí a procurar,
Rir pra nao chorar.
("Preciso me encontrar", Cartola)

Tarde vazia imersa de uma indescritível ausência.
Badalam sinos ao longe,

Como se fosse à última chamada para algum ermo lugar...

Não sei para onde ir agora,

Não sei para onde você se foi,

Não sei os motivos que a levou selar seus lábios...

Hoje tudo é castigo.


Da janela do trem,
A paisagem trafega lentamente de um ponto a outro,
A sua imagem repetida vezes passam em minha mente,
Quais os pecadilhos que fizeram nos afastar?
A crueldade fez distanciar as nossas mãos,
Minha voz já rouca não chega até seus olhos que tanto precisa ouvir,
Que o tempo não distingue o tamanho dos erros...
A cada imagem uma lembrança da saudade incontida.

O sol bate na minha cabeça,
Porém não é o suficiente para iluminar o caminho para o seu abrigo,
Tudo parece ter sido tragado pelas trevas,
Anseio e não consigo tocá-la,
Sinto-me pálido com o sangue preso nas veias...
A lágrima que secou sobre a face,
Atado, sinto-me uma angustiante impotência.
O amor quando em estado de tormento,


Sangra até a raiz da nossa essência,

Não sei o motivo de tanta fuga dispersa e silenciosa,
Sinto a dor percorrida no peito que enrijece todos os meus músculos,

Calam minha alma trancafiada,
Cultiva as flores opacas do meu jardim de pesadelos,

E fecho pausadamente meus olhos,

Até quando permanecerá tamanho castigo?

terça-feira, 16 de outubro de 2007

Uma lápide para o super-homem


Não existe um super-homem,
Tampouco as vísceras de um homem de aço,
Não garante a Paz com seus músculos inatingíveis,
Não existe a garantia da esperança.

O super-homem é uma mentira,
Como todas as meias-verdades apregoadas pelos apadrinhados de Mefisto,
Constrangido pela realidade,
Ele prometeu resgatar o mundo,
Caiu sem salvar a si mesmo.
Promessa vazia ou castigo demasiadamente pesado?
Todas as verdades robustas possuem pouco néctar da mentira.
Tolices, crendices e a paixão movida no ritmo da exaustão.
O super-homem sangra entre carne e dentes,
Possui lacrado em seu coração o medo e a dor,
E não é imune a corrosão...

O super-homem fracassado dos delírios surreais,
Não impede tragédias,
Não atravessa precipícios,
Não salta desvairadamente entre os prédios.
O super-homem é miragem,
Pelas suas mãos escorrem areia e sonhos,
O super-homem é falso mito,
Mitologia pagã de um altruísmo patético cercado por um mundo de superficialidade,
Sangra com a lâmina que crava o seu peito,
O super-homem cai num lago de águas turvas e enegrecidas de suas lamentações.
Sem forças, atirado entre o vão dos edifícios.
É possível ouvir a platéia sentenciando seu destino:
- "Incinerem o super-homem!", gritava um desconhecido em pura catarse.
- "Roubem o seu coração!", ecoava mais um delirante carrasco.
- "Dilacerem a sua alma!", pregava alguém segurando um evangelho.
Os risos e as palavras de escárnio se ouvem ao longe...

Podem calar a sua voz,
Retirem até o seu último sopro de vida,
Todavia é preciso ainda atender o seu último pedido...
Mesmo castigado pelas luzes que cegam os sedentos de carne e sangue,
Ninguém poderá nunca dizer o contrário:
Agora, mesmo caído e sem esboçar reação,
O super-homem nunca foi desprovido de coragem e afeto.
Sua luz cega os olhos desprovidos de espírito.

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

O homem esquecido


O diabo, o sedutor deles, lançado para dentro do lago de fogo e enxofre, onde já se encontram não só a besta como também o falso profeta; e serão atormentados de dia e de noite pelos séculos dos séculos. (Apocalipse, 20.10)


Hoje sou um homem esquecido,
Meu passado sumiu com a poeira volátil do tempo.
Hoje sou menos do que tinha sido ontem,
Ontem foi a aventura que delinearia o nosso amanhã.

Quanta tormenta foi inoculada no coração!
No espelho observo meu rosto com olhos extáticos,
De vida pétrea hoje sou argila,
O amor que nutria ceifou minha seiva,
Algemou minhas mãos trancafiadas no ostracismo,
Vazio voraz imerso num escuro calabouço.
Regurgitando palavras sem direção,
Conto aleatoriamente minhas feridas abertas...
Uma, duas, três... São muitas!...
Balbucia a saudade,
Mas nunca sacia a sede.

Tudo o que fui,
Hoje sou a lembrança de um gélido deserto.
Esquecido sobre o porta-retrato derrubado na mesa...
Flores? Todas despencaram suas pétalas.
Sorriso? Todos friamente emudecidos.
Ternura? Tudo transformado em poeira de asfalto.
Quem se lembra?...
Talvez com algum esforço você possa lembrar...
Ontem era o brilho de nossa luz,
Hoje um martírio em trevas,
Os sinais apregoados com um beijo na cruz,
A noite é a lança perfurante que não deixa a alma perecer.

Esquecido pelo tempo,
Corroído pelas injustiças,
Negada qualquer tentativa de sintonizar a voz.
Agora ecoa erraticamente o grito proferido no alto da montanha...
Ninguém ouve,
Ninguém vê,
Ninguém se importa!
Hoje estou esquecido.
O passado é a lembrança do que jamais poderia ter acontecido!

Ontem era pleno amor,
Hoje o desamor de qualquer humor.
A vida não são apenas pedras...
É também consternação.

O homem esquecido esmaecido em sombras tão atadas pelas angústias,
Um lamento de desencanto é o refúgio dentro da alma,
Os dias tornam-se tão insanáveis quando a derrota sublima a vida,
No chão caído sobre alguns goles de álcool e o azedume que peregrina na boca,
O amor quando não se revela amordaça todos os sonhos...

E tudo é esquecido por aí...
Na varanda do apartamento,
Na sala onde tanto desejo se fez presente,
No silêncio do quarto vazio,
Na cama ausente de companhia,
No café solitário do domingo,
Na boca seca sem afeto...
Hoje os dias são amargos como a cruel distância.

O homem esquecido,
Pelo abandono dos sonhos mútuos,
Pelo desejo confinado pelos fantasmas,
Preso pelo silêncio da indiferença,
Medos e mais medos bailando sobre nossas cabeças,
Uma gota de sangue desliza na ponta dos olhos,
Pairando levemente sobre sua mão...
A vida passa esperando você despertar...
Somente seus olhos ensurdecidos não percebem,
Acordar, viver antes de perecer.

Chove lá fora e nada mais além para festejar a nossa queda,
Levante a cabeça e olhe para cima,
O que vê é o que não pode ser ignorado,
Nada pode deixar de ser lembrado...

Lá no alto,
O homem esquecido,
Uma chaga no peito,
Mãos abertas em vão,
Atado na cruz.

Autopoema (Canção Verborrágica)


Eu faço versos como quem chora,
De desalento, de desencanto, de desilusão!
Eu faço versos como quem acredita,
Na devoção da escrita,
Compor a amada através das palavras...

A cada rima uma saudade,
A cada metáfora uma lágrima,
A cada estrofe uma angústia.

Escrevo para buscar encontrar
Um gesto, um sorriso, um semblante...
Recompondo recordações que não enxerguei,
Refazendo o que eu nunca fiz,
Sonhos que nunca alcancei!

Em meus versos verborrágicos,
Carregados de espasmos,
Registro a canção d’álma:
Sem máscaras, sem o ar leviano
Do mero feitio rebuscado da escrita.

Em traços não-lineares,
Livre condução da dor,
Há um constante conflito,
Entre a palavra cética
E o cético sem palavras.

Na árdua missão de não confundir,
A devoção com a razão,
Sem alvejar unívoca solução,
Vagando entre uma pseudo metafísica
E a incômoda presença positivista.

Não há azul no céu que acoberta,
Não há azul no mar que naufrago,
Não há azul no solo que caminho...

O manto da ausência me envolve
E na solidão as metáforas no papel refazem:
Desejo quase insanos,
Confissões patéticas,
Emoções suprimidas...

Cansado de lutas inglórias,
Repouso-me no rascunho deste versos
Lembrando o vão passado,
Recriando vãs saudades...
Atmosfera sem oxigênio!

Não acredito na veleidade dos deuses,
Não acredito na premeditada teologia,
Não acredito em fórmulas que preconizam panacéias,
Nem acredito em divindades,
Não acredito nos dogmas da verdade!

Buscar,
Burlar,
Acontecer,
Não conseguir... Perder!
Vastas são as denominações,
Vasto é o vazio...
Se o sentido para escrever
É para cantar minhas mágoas,
Então, não poderia ser diferente,
O cantar de meu triste presente,
Cheio de tantos desencontros
E tantas palavras incoerentes...

Quando Deus saiu de férias


Na noite de total penumbra,
Os dias seguem o curso negro
Como uma horda vociferante de morcegos hematófagos,
Deliberadamente atrozes e vorazes,
Buscando saciar até a última gota de sangue,
Como cães que ladram e lutam por um pedaço de pão molhado.
O silêncio é uma nódoa sem brilho.

Caído em uma poça de desencanto,
Cambaleado com as vis palavras,
O corpo é deixado como se estivesse num processo de evaporação,
Na calada da noite as adagas são fincadas no peito,
E novo silêncio açoita anunciando a abertura dos portais,
Quais os caminhos que são percorridos no vazio?
O abismo abraça todo aquele que desiste de sua própria alma...

Tenho escolha? - Pergunto-me a todo o momento.
Não ouço resposta!... E ainda haverá alguma resposta?
A temporada de caça às minhas convicções está aberta,
A cabeça pesa de forma incomensurável...

O silêncio do vagão é rompido,
Um senhor de óculos segurando ansiosamente uma Bíblia,
Recita freneticamente em paroquial alto som,
Que ninguém vem ao Pai sem desvencilhar da dor,
E quanta dor derramada!...

Dias, noites, madrugadas, primavera cinza...
Somente Mefisto maligno me acompanhou,
Se hoje sou um desconhecido,
Amanhã talvez a saudade lhe apunhale cortantemente...

Uma lágrima escorre pelo canto de um olhar insalubre,
E secam com o passar do tempo...
As mãos trêmulas e irrequietas são guardadas no bolso,
O corpo balança com o chacoalhar do trem.

A fé criou pó,
A luz vingou cruz,
A súplica virou dor,
A boca secou o beijo,
A voz marcou a alma,
Os pensamentos vigiam a esperança,
A paixão sacrificada foi negada,
Abafada com as vísceras expostas,
Agora, todos os fantasmas visitam o seu berço,
E meus olhos atônicos fazem vigília do lado de fora da redoma.
O temor que consome e nega
É a mesma angústia atroz que crucifica minhas pernas.

Deus saiu de férias!
Foi anunciado em folha de jornal.
Em qualquer cor é possível sentir sua ausência,
Ninguém ouve mais nenhum sopro de vento,
Olhos perdidos no escuro e passos sem rumo,
Os ventos chacoalham os galhos secos da existência,
Alguém fechou a porta...
E apagou a luz!...
Silêncio...

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Lágrimas de chuva


Qué lejos, lejos, lejos continuamos,
nos alejamos de las duras máscaras
erigidas en pleno silencio y nos iremos
envueltos en su orgullo, en su distancia.
( Pablo Neruda )

Cai uma gota...
Cai uma gota de chuva
que esparge sobre o vidro da janela,
escorrendo como um imenso ínfimo rio,
vagando indefinidamente,
deixando uma tênue trilha
da lembrança de sua queda.

Cai uma gota...
Cai uma gota de lágrima
que desliza sobre a face lânguida,
descrevendo um perene caminho
em busca de uma rota
que conduza a seu coração.

Cai uma chuva...
Caem rios de chuva
que molham meu triste rosto,
molham minha alma,
misturando-se com minhas lágrimas
mesclando-se em minha dor.
Chuva e lágrimas
são as águas do mar desse náufrago,
alimentando a angústia de uma longa expectativa
esperando que um dia
essa tristeza tenha fim.

No vidro úmido
e nos meus livros molhados,
vejo o seu semblante,
meu profundo Amor.
Vejo o seu sorriso,
quase sério,
que me encanta,
que me congraça,
que fomenta a minha alegria,
que me faz acreditar na esperança.

A sua distância abre um abismo em minha alma
e a sua ausência aprofunda minha solidão,
padecendo o meu coração...
Se Você esta tão longe, tão distante,
entenda que estou tão perto
sem saber como chegar.
Saiba que meus sonhos
não existem sem Você...

Sob o silêncio de suas palavras,
afugentadas de seus lascivos lábios,
perco-me no espectro de meus inglórios temores.
Não proponho
nutri o seu tédio,
suprimir a sua razão,
exaurir o seu coração,
subtrair a sua felicidade.
Apenas manter acesa
a pira de uma Paixão
que faz sofrer calado
meu Amor por Você.

Não proponho transcrever
palavras oriundas somente da emoção.
Mesmo porque a emoção solitária
é transitória,
vaga,
insensata,
vazia,
passageira de um lúdico percurso:
inerte e desconexo.
É fácil, palidamente, dizer:
Te Amo!
Difícil é demonstrar esse Amor.
Acho que não sou convincente,
não sei como fazei-la compreender...
Creio que não sou a pessoa de seus sonhos,
mas como gostaria que fosse...
Acredite! Confesso que procuro ao máximo
expor os meus sentimentos por Você...
Se tudo o que faço
apenas lhe trazem aborrecimentos e ira...
Perdoe-me,
pois não sei fazer melhor...

Apesar de todos os ditames,
são palavras de quem a Ama,
afetivamente,
pacientemente,
silenciosamente,
infinitamente...

Como uma sinfonia de lágrimas...
Lágrimas de chuva
ecoando pela janela,
ressoando pelo meu rosto,
recitando minha dor...