
Um dia você apareceu com cores primaveris e ares angelicais,
Uma aura de Paz, um adorno de crisântemos e uma rosa na mão,
Ingenuamente o meu peito pulsou como se desejasse vir à tona,
O tolo Paraíso tão solicitado haveria enfim se tornado material.
Diante de uma fábula narcísea não respeitei a moral em jogo,
Imergir nas dimensões de um oceano de volúpia e arrebatamento,
Sem escorar-se na razão, o mergulho foi profundo e inevitável,
Ao cair nas águas até chegar ao solo lamacento subaquático.
As promessas foram ofertadas às dezenas ou centenas,
Ouvia tudo atentamente como se quisesse de fato acreditar,
O encanto amoroso é como um veneno subcutâneo,
Quanto mais irreal, mais se deseja não encontrar desenganos.
Em qualquer sonho desabrochado, entre o Amor e a Paixão,
É melhor ficar com os dois para não se frustrar de antemão,
A vida é tão mais árdua e no mercado dos suvenires sentimentais,
Melhor um delírio na mão do que um coração pétreo no porão.
Sobrevivia a ciência que dos seus olhos nada se tinha certeza,
Mas não ousava acreditar em nada que pudesse descontentar a ilusão,
Na ânsia de degustar intimamente a novidade no céu da boca,
Ocultava-se toda a insensatez pertinente à claustrofobia do vazio.
Aquelas meias-palavras debruçadas na cama ao som dos seus olhos,
Um carteado de verdades provisórias e a força de afagos íntimos,
Faziam acreditar que tudo seria indivisível, estático e uno,
Sem o menor juízo e o tempo com seus ponteiros adormecidos no freezer.
Sinceramente, não foram mentiras tão cruéis,
Nada que fosse fora da medida do mundo que queria criar,
Aquele sentimentalismo juvenil, audaz e irrequieto,
Roçando a umidade porosa nas fronteiras dos lábios.
Não se pode ousar nada de tão grave ou pernicioso,
Também não quero a simples crucificação grosseira,
Na dor, o Purgatório até tem cara de salvação,
Com quantas bobagens se corrompe um coração?
De repente, como uma bússola embriagada no espaço,
Seus lábios que outrora deslizaram doces prazeres e aroma sensorial,
Disse sem nenhuma explicação um indefectível e lacônico adeus,
Com uma secura que petrificou qualquer lágrima que teimava despejar.
Ninguém em ofegante delírio pueril acreditaria numa despedida tão insólita,
Eis o tempo e os cortes profundos duraram para além do inevitável consolo,
Confesso ao meu torniquete que não desejaria tantas chagas para a sua vida,
Peço a Deus somente que o Inferno não seja o lar de suas próximas vítimas.