quinta-feira, 22 de abril de 2010

Ecos da Lápide


Saber pouco para não gritar enlouquecido na noite,
O que resta a desfilar em becos escuros sob a palidez da Lua?
Viver tampouco para sentir tanto e intensamente,
E muito ainda para ser desdobrado em outros caminhos.


Não cantarei as batalhas esquecidas na agenda,
Na cruel face da lápide nenhuma guerra é sepultada,
Enquanto for travada com o brio sincero das convicções,
Perder ou ganhar são meras fatalidades infames e narcíseas.


A chuva que desaba lentamente no asfalto frio,
Encharca o corpo nesta despedida sem oração,
Não declamarei versos de glória ou falsos pesares,
A história não-escrita já entrou no rol da vitória.


Selo meus lábios em titubeante conformidade,
Que a sua luta jamais seja tratada como um rascunho esquecido,
O futuro é um desenho rabiscado com grafite,
Com pueris expectativas maiores que as possibilidades.


Estrada pétrea para o fardo preço da memória,
Relembro com ardor na languida despedida,
A finitude lacônica de doces virtudes e enganos fortuitos
Ao sabor que a vida pedia mais... Quanta ingenuidade!


Selo aqui na cabeceira de morte,
Tudo que foi pilhado em vida,
Também o que não foi rabiscado ou suprimido,
Serão colocados na contabilidade da história.


De tantos clamores, traições, cânticos e valsas,
Músicas de toda sorte perene na saudade,
As palavras se confundem com o pranto,
O silêncio se materializa para além da verdade.


Toda forma de consolo é pouco e todo pecado é pasto,
O incipiente conforto busca sublimar o impossível,
Para não perecer diante do tísico abandono material,
Celebrar na memória o que se armazena no diafragma.


O chão salgado pelo sangue irrigado pelo destino,
Circulante no leito de sombras diante da platéia,
Observo seus olhos cerrados de forma insólita e mãos gélidas,
Para reluzir e aquecer em um novo mundo etéreo.


Os sinais dos tempos são tempestivamente vorazes,
Peito inchado e canções salobras regadas à Alzheimer,
Contra a perda da identidade e a face turva no espelho,
Ouvir-se-ão nos quatro cantos os ecos da luta lapidada na história.

Um comentário:

José Jailson - JJ disse...

Mestre Wellington,
li atentamente, três vezes, o poema “ECOS DA LÁPIDE”.
São versos geniais em estrofes “chutes na canela”.
As minhas ficaram com doloridos hematomas.
Com um dicionário em mãos farei nova leitura.
Não é sadomasoquismo.
Tentativa de ceifar o resta do meu narcisismo.
Um forte abraço, JJ.