sábado, 10 de outubro de 2009

Vazio Colérico


Você sabe tanto quanto eu,
Não há verdade eterna ou absoluta razão,
Ninguém sabe quantos tijolos pavimentam a estrada,
Do destino apenas conhecemos o princípio.


Se a verdade foi feita de refém,
Não queira alimentar o ego com ilusões banais,
Quem chega depressa espera pôr a mesa,
Quem cochila encontra os pratos vazios.


Não há chazinho adocicado para alma em devastação,
Não há álcool que cure miraculosamente os males,
Queremos tudo ao mesmo tempo para ontem,
A espera angustiada do microssegundo.


Do espelho reluz a fragmentação do ego,
No interior da íris a turbulência do inconsciente,
Qual fagulha que desencadeia a centelha?
Não há Paz que resista a uma permanente escravidão.


O Amor virou uma abstração comestível no horizonte das utopias,
Confortado num pote de vidro e singela fita colorida,
Após o consumo a embalagem é reciclada,
Contabilidade afetiva: Ama-se um, dois, três ou mil.


Os lábios trincados têm insosso sabor dietético,
A paixão figurativa com data de validade no rótulo,
O consumo de iguarias e querelas sentimentais,
No videoclipe, a fugaz porosidade do coração.


Há um vazio no meio do universo,
Fossa abissal preenchida de ar frio,
Tanto riso que não encontra graça,
Sangue, soluço e overdose de Prozac.


Em bancas de jornal tantas revistas coloridas,
A promessa de felicidade plena e instantânea,
Emagreça, corra, compre, goze e sorria,
Há sempre uma câmera para a vigília dos passos.


A assepsia do contato humano e gestos burocráticos,
Egocêntricas cidades em suas redomas de vidro,
O self-mundo encantado da autonomia de Narciso,
A caricatura patética do empreendedorismo umbilical.


A exuberância da pragmática superficialidade,
A violência dos egos em conflito e o medo atroz,
Mentiras apáticas diante da multidão do vazio,
Cada um atado à ilusão da feroz velocidade para o grande nada.

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