segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Abstinência


Quanta dor pode selar o coração de um homem?
Quantas adagas afagam as vísceras de um peito?
Quanta angústia poderá esconder no labirinto inexpugnável da alma?
Quantas palavras nunca ditas vazam do canto dos olhos?

Para que cultivar a distância se o melhor mesmo é aproximação?
Toda vez que ando é esta a questão presa na minha mente.
Toda vez que deito é esta batida intermitente que assola meu peito.
Toda vez que silencio é esta louca espera do dia que a noite lacrou sorrateiramente.

Quais as chagas que terei que acalentar ao repousar perante seu corpo?
Quais os rios que precisam desviar seus cursos para que possam desaguar em seus lábios?
Quais as feridas estioladas da minha dor que adulam o seu humor?
Quais as medos que maculam intrinsecamente seus mais abissais sentimentos?

Lábios adormecidos de tanta sede,
Saliva seca de tamanha espera,
Mãos reumáticas erguidas ao céu.
Corpo que anseia torrencialmente seu ventre.

Nunca fui anjo e tampouco qualquer Salvador.
Nem mesmo nunca fui convidado a jantar na senzala de Mefisto.
Não vendo ópio e nem propinas banais.
O silêncio é adaga que fere ferozmente minha carne.

Acordar, sentir, erguer e cair.
Verbos contidos numa dor implacável.
Ações deletérias que estanca o sangue em coagulação.
Gritos de espasmos inaudíveis ecoados do fundo de suas dores.

Não existe Paz quando as sombras rondarem seu corpo.
Quantos vultos passaram pela sua vida e nada acrescentou?
Quantas mentiras lhe foram cinicamente prometidas?
Quantas dores no submundo do seu inconsciente foram regadas às lágrimas?

Lembra do dia da promessa de nunca partir?
Lembra do delírio quase infantil que eram todas as nossas vontades?
Lembra de que todo o desejo era estar mais próximo?
Lembra que nada poderia ser jogado fora em vão?

Na selva dos desencontros manchados de sentimentos pluviais,
O Tempo corrói todos aqueles que brincam de burlar a vida,
Um jogo de delírios irreais e martírios cutâneos.
Lâmina em sangue fino separando nossas mãos.

Seus erros são contabilizados como vitórias?
Sublimação de medos em tempestade.
Não comemore a derrota como sabor de liberdade.
Veja que poderá a vida ser reencontrada diante de nosso timbre.

A teimosia é opressão quando não enxerga o Amor diante de todos os apelos,
A autofágica abstinência do seu olhar,
O corte tangido no aço a silhueta no peito.
A fome voraz de adentrar no seu corpo inteiro.

Um dia a insensatez irá curvar perante o implacável destino,
A razão mergulhada em apatia e egoísmo enfim prestará contas à sua alma,
No perde e ganha indigesto e sem rimas fáceis ou flores a sua espera,
Um balanço final de tudo o que nos separa hoje,
Minha voz ecoada que bate a sua porta ansiando avisar seus olhos em neblina:
Desperte amada!
Amanhã somente haverá longa marcha de tristeza atávica coagulada em lágrimas.

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