sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Águas de Inverno (Dias Insalubres)


A chuva que se fragmenta no céu,

Desaba sem piedade sobre os ombros,

Encharca todas as vestes impunemente,

Resta então um corpo frio e desconsolado.



A chuva que inunda a cidade,

Desliza granizo sobre o alumínio da janela,

Numa artilharia semelhante aos tempos de guerra,

Ao que remete à guerrilha cognitiva de cada dia.



A chuva espalha seus sequiosos caprichos,

Inunda sarjetas e transforma calçadas em rios,

Arrasta tudo o que encara pela frente,

Abate a todos com severidade.



A chuva que precipita sobre nossas cabeças,

Afoga coragem e afaga temores,

Emana sobre bueiros tanta sujeira,

A cidade de impurezas e olhos atormentados.



A chuva que invoca demônios,

Leva-nos ao lar de Gehenna,

A angústia da desolação e incompletude,

A cadeia de acontecimentos profanos e arcaicos.



A chuva que abraça a solidão,

Na atmosfera rarefeita da hostilidade cotidiana,

O conflito presente imerso no inconsciente,

A aspereza dos dias selvagens e insalubres.



A chuva que canta num dia cinza,

Nublado de trevas e silêncio,

A janela fechada sem saída,

O abajur enfeitando a sala sem iluminação.



A chuva indiferente e salobra,

Calada sem compaixão imediata,

Rica de fel, cancro e veneno,

Escorrendo pelos poros das almas em tormenta.



A chuva de águas turvas,

Destila mentiras prosaicas dos opressores,

Que cala anulando os corpos lacrados,

Quem grita a esmo é acorrentado à fogueira.



A chuva que corre como sinos do último aviso,

O Paraíso que fecha suas severas portas de fim da colheita,

Tantas almas desabrigadas à espera da inútil salvação,

Tanta água esbanjada que não purifica a todos.


Nenhum comentário: