sexta-feira, 10 de abril de 2009

Anti-cartão Postal (Anônimos Paulistanos)


São Paulo de nítidos contrastes,
República de vias convulsivas,
Palaces podres e deserdados,
Cidade nua sem disfarces.


Anhangabaú, vale de beleza e pobreza imaterial,
Ampla arquitetura aromatizada à uréia,
Ritos históricos e paisagem degradada,
Memória esquecida, aneurisma social.


Alguns párias vagantes circulam sem rumo,
E outros párias pairam alcoolizados ou entorpecidos à crack,
Putas na permuta de um naco de carne humana por alguns trocados,
A multidão mesclando-se na horda dos desvalidos paulistanos.


Vendem-se qualquer quinquilharia,
Paulistanos natos ou postiços na feroz sobrevivência,
O mundo é um grande esgoto à céu aberto,
Exalando toda a imundície insensível da cidade.


Crianças apátridas perambulam num mundo abortado,
Exalam cola e entorpecem silenciosamente à álcool,
Cadáveres moribundos libertos do seu mundo,
A severa hostilidade insone sem prumo.


Atiram pedras em ônibus,
Vigiam a sacola alheia,
Zombam de suas próprias desgraças,
A infância roubada sem hesitação.


Os cines de sexo total,
Vinte e quatro horas de puro êxtase na palma da mão,
Amor livre pré-fixado em três reais,
A sensualidade promíscua nos calos dos dedos.


São Paulo que fede,
Cheira ao falo gotejante dos que pisam nos vencidos,
Cidade que excreta seus filhos banidos,
Inválidos que caem mortos sem significados.


Uma donzela da tarde se aproxima,
Um convite sutil para o “love”,
Mas se pode hesitar simplesmente por conveniência ou juízo,
Quem ama realmente na cidade solitária?


São Paulo dos que nada herdaram,
Dominam os subterrâneos dos esgotos,
Os trens metropolitanos que rasgam a cidade,
A perpetuação banal da desgraça cotidiana.


São Paulo que esconde seus mortos-vivos,
Gritos ocultos pelo barulho dos automóveis,
O vale que escorre as agonias dos amordaçados,
A cidade que não se vê no cartão postal.

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