sábado, 23 de janeiro de 2010

Convalescença


No cálice obscuro da essência,

A linha entre o imaginário e real foi violada,

Sobressalente, a vontade foi desfigurada,

Sobre o solo, cinzas e um pouco de agonia.



As nuvens dizem pouco sobre o passado,

Quem poderia prever o futuro,

Quem garante a precisão dos fatos,

Inúteis, todos os esforços foram sublimados.



Quantas palavras implodidas perambulam no ar,

Saliva seca e silêncio canhestro no paladar,

Luzes e rimas sem sinais de alguma conclusão,

Diante do vazio, as lamúrias de um querer suprimido.



O dia ascende tímido no céu,

Respirar até os pulmões começar a reclamar,

O que resta quando o chão se abre?

Nada!... Além do próprio semblante no espelho.



O sinal fecha e a luz enegrece,

Prostrado, o corpo permanece imóvel,

Quem sabe no compasso de um momento propício,

A anfetamina inoculada não faz o prometido milagre.



Agora, a chuva que cai lá fora,

Estilhaça seus pingos na janela,

Pensamentos marejados pelo tempo,

Sentenciam o valor das banais ações.



Com temor do escuro, a mão inquieta apaga a luz de parafina,

O breu domina toda a paisagem com toques tingindo a espinha,

Pássaros bicam na janela uma sinistra melodia,

Desatina no vácuo: “Quem eu sou quando estou ausente de mim?”



De passagem, as respostas parecem trafegar em trilhos de trem,

De estação em estação, a razão talvez possa chegar com mais segurança,

Na trilha do dissabor desconfortável da angústia,

O desvelo da alma é o reconhecimento de tudo ao redor.



Em fúria, há momento que se deseja o Inferno para o mundo,

Todavia, com mais calma e oxigênio se percebe que nem tudo é em vão,

Na superfície da escrivaninha está o espaço deixado pela fotografia,

Lembranças tecem latejantes sobre a pele tanto quanto espinhos em brasa.



O corpo pede em tom de quase desespero para ser imaculado,

De sobreaviso, o coração anseia para não mais estilhaçar novamente,

Somente quem respira poderá contar alguma história,

E toda liberdade apenas sobrevive na retina do olhar.

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