domingo, 2 de dezembro de 2007

(In)transparências (ou Mentiras sinceras, verdade corrompida)


A verdade está lá fora?
Quem sabe esquecida dentro de alguma gaveta?
Em algum lugar onde não sei mais buscar,
Debaixo de uma pedra ou fincada no leito de um rio,
Sobrevoando arranha-céus em desfilando em becos,
Na vala de um córrego ou velada pelas lágrimas de algum cemitério,
Na areia recheada de penachos dos galos de uma rinha ou na batalha insana do trânsito,
Pairando em cima de um telhado ou sendo levada pela correnteza de alguma chaminé.
Incinerada por uma fornalha ou sedimentada por um desmoronamento após as águas de março,
Na boca disforme de um leproso ou nas mandíbulas de um chacal.
Nunca chegamos a real verdade,
Dúbia, passional e fosca,
A verdade é um caminho conduzido pela fé dos mortais.
A verdade tem propriedade ou será um bem coletivo?
Qual o seu preço na bolsa de apostas?
Quem sabe se aproximar de onde a verdade está?

Quais os passos que levam a minimizar a distância,
A verdade entre os seus e os meus lábios?
A verdade que ninguém sabe ao certo,
A verdade que nutre tantas ansiedades.
Envolvemos-nos com tantos dilemas e postulamos nossos horizontes,
Por que não conduzimos nossas vidas observando o próprio interior?
Onde a verdade está? – eis a sempre alucinada questão.
Qual a trilha verdadeira a peregrinar?
Ninguém sabe?... Talvez ninguém tenha razão.
Cada gesto é um olhar impessoal,
Particular de cada alma açoitada pelo Tempo,
Cada artifício jorrado pelas palavras em desavenças,
Nada indica que chegaremos o fio da verdade,
Nada poderá conduzir uma estrada sem dolo.
Nada vai salvar as almas condenadas pelas próprias mãos.

Quem é o dono da verdade?
Quem é o criador que conhece seus sortilégios?
Quem acredita que exista uma única verdade?
A verdade impregnada em cada um de nós,
Nutrida por cada sílaba acre de sangre,
Podada pelas intempéries do destino particular,
Jazigo abreviado do longo martírio dos dias em descanso.


Recorde para o que há dentro de sua alma,
Quais os dias mais felizes que possa fazer lembrar?
Quantas verdades absorvidas de sentimentos reais?
Quantas palavras deixadas de lado para nenhum propósito?
Quantos olhares que se perderam na trilha fechada da indiferença?
Ao sabor dos ventos é deixada a vida fluir,
Sem rumo ou direção,
No limite profano entre a alegria e a insensatez,
Mãos em derrotas, joelhos dobrados rente ao solo,
A janela que se fecha guardando algumas verdades,
A voz rouca de tanto querer dizer verdades,
A saliva que secou engolindo poucas verdades,
A verdade das fobias.
A verdade dos infames.
A verdade dos canibais.
A verdade dos insanos.
A verdade dos lunáticos.
A verdade dos enfermos.
A verdade dos solitários.
A verdade dos embriagados.
A verdade das alcovas.
A verdade das alcoviteiras.
A verdade dos crentes.
A verdade demente.
A verdade que tanto mente...


A mentira cansada de ser pregada como verdade se transforma na própria verdade.

A verdade escancarada,

A verdade necrosada.

A verdade tão errônea,

A verdade esquecida.

Certo ou errado?

A verdade é uma pedra quase nunca lapidada.

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