quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Vinte Graus em Noite Escura



Madrugada, 20 graus, diz a estação de rádio,
A febre vai muito além da temperatura ambiente,
Um mal-estar permeia sobre o leito em noite adentro,
Luzes apagadas e um mundo para refletir.



Borbulha inconstantemente o estômago,
Emitindo um chiado de vísceras se digladiando,
Numa insone batalha camicase em pavio curto,
A cabeça rondando sem nenhum destino.



Caminho em passos curtos pela casa,
Volto ao rádio buscando alguma notícia na noite,
As reportagens se repetem a cada mudança no dial,
Como a barbárie intrínseca da sociedade.



Querendo sair com autonomia deste leito,
Porém viro refém involuntário de seus caprichos,
Por mais que desejo alguma sensação de liberdade,
Parece que nada se conquista com algum mérito sem beijar a cruz.



Observo o teto buscando algumas explicações,
Confesso à minhas feridas: Que medida tão inútil!
Dificilmente as paredes me revelaram algum segredo,
E segue a sina adormecida no vazio.



É inevitável que em momentos de solidão,
A saudade bate à porta com extrema violência,
Seja para questionar atos passados,
Seja para atordoar gestos futuros.



No presente não há nenhuma saída consistente,
As palavras se calam adormecidas,
Não sei mais o que pensar ou verbalizar,
Apenas bem sei que o Amor não passou...



Levanto novamente e caminho pelo corredor,
Percorrendo algumas vezes o mesmo trajeto,
Os pensamentos saltam da memória,
E o corpo cansado pede de novo o leito.



Faço mais uma tentativa de fechar os olhos,
Quando abro, o Sol ilumina a janela,
Tanta vida poderia ser recitada com tanto brilho,
Se a escuridão não tivesse afastado nossas mãos.



O que você estará fazendo agora?
O que me resta então seria um pouco de imaginação e a saudade,
Presas no cativeiro das lembranças,
Sentidas bem de perto pela dor nos olhos.



Difícil achar alguma plausível explicação,
Quando dialogamos em silêncio com o teto imóvel,
Articulamos pensamentos e construções simbólicas,
Porém a realidade é um trator sem freios perante a vida.



No vazio do leito de lençóis desalinhados,
A garganta áspera e a boca toda seca,
Por mais alguns dias permanecerei assim,
Pena que a saudade também não tenha prazo de validade.

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