Espaço dedicado à análise, reflexão e crítica dos enlaces, desarranjos e autofagias do homem (i)material e o desencanto do mundo contemporâneo.
domingo, 19 de agosto de 2007
O caminho das pedras
Tenho sempre fome desse
Lugar que nos foi espelho,
Das frutas curvadas dentro
De sua água, luz que salva,
E gravarei sobre a pedra
Lembrança de que brilhou
Um círculo, fogo ermo.
Acima é rápido o céu
Como ao voto a pedra é fechada.
Que buscávamos? Talvez
Nada, a paixão só é sonho,
Nada pedem suas mãos.
E de quem amou uma imagem,
Por mais que o olhar deseje,
Fica a voz sempre partida,
É a palavra toda cinzas.
(Yves Bonnefoy, “Uma pedra (Une pierre)”)
Mais uma vez derramei uma lágrima
Ao observar seus olhos em desconsolo,
A saudade e a angústia rebelando-se mutuamente em fuga delirante.
São infinitamente fugazes todas as tentativas de compreender a razão,
É a emoção calando-se de comoção existente no fio da vida.
É tão sobre-humano sobreviver em sua ausência,
É como um cofre sem chave,
Um corte sem sangue,
Uma dor amordaçada pelo silêncio!
Não direi adeus sem olhar para o firmamento dos seus olhos,
Não rebuscarei palavras fadadas quase insones,
Não desacreditarei na esperança imersas em trevas,
Não renegarei a benevolência de um Deus incompreensível,
Não sonharei um sonho de longos pesadelos e falsas tragédias!
Não! Bendito Deus que impera nas alturas,
Onde esconde seu manto de razão?
Justas são as palavras do justo,
Verdadeiras são as ações de um não-pecador,
Sinceros são os motivos que curvo meu dorso em busca da luz,
Não castigue minha hercúlea pretensão!
Purifico-me de desígnios oriundos de minhas inclinações mais íntimas,
No úmido escuro de meu calabouço,
Recluso do mundo, recluso da vida,
Esboço palavras com cores draconianas,
Quase como o sangue da pena que delineia tais versos,
Quase como cinzas do desconsolo d’álma,
Quase como uma prece louvando um desejo mordaz...
Como a própria insensatez!
Se o castigo é iminente,
Não temo ser podado da imensa árvore que floresceu!
A vida pode conter todo o sem-sabor da desrazão,
Mas as lembranças tingidas no pano de fundo da memória
Não são apagadas, nem mesmo alteradas substancialmente,...
A felicidade jamais é esquecida ou puramente sufocada,
A felicidade é suavemente perene quando se busca desvirtuar-se do óbvio,
A felicidade não se esquiva do inconsistente desequilíbrio da fobia!
A cada pedra revirada no seu hermético coração
Abrigam-se mágoas em silêncio absortas,
Absorvendo, uma a uma, cada lágrima de cada lembrança emersa.
A cada pedra que se instala em seu caminho,
Seus estreitos passos a circunda com sôfrego temor
E após alguma distância,
Uma nova pedra à vista
E, repetidamente, Você a contorna, mas nunca a supera!
Por que o temor se tem a vida adentrando o futuro?
Por que não pôr aos ares tais pedras arraigadas?
Por que o receio de não superar obstáculos irremediáveis?
Inverossímeis são as tentativas de liberdade,
Se o amor não for capaz de suplantar obstáculos,
Nada mais o será!
Se a dedicação não encontrar a saída,
Num labirinto em chamas seremos consumidos,
Sem tréguas, sem descanso, sem água,... Sedentos de vida a viver!
Entre anjos e demônios,
Você se aprisiona em um quarto sem claridade.
Entre anjos e demônios,
Você procura abrigo em pequenas verdades infundadas.
Entre anjos e demônios,
Céu e Inferno lhe confundem o caminho,
E sua incerteza é cada vez maior!...
Estática observa ao espelho através de si
E o que vê não lhe convence...
O travesseiro lhe faz companhia
E nele o desabafo se reduz em pranto...
O vazio lhe apavora,
Gotas de lágrimas respingam em sua roupa,
Mãos trêmulas, olhos estáticos,...
Seu coração anseia respostas
E a todo Você observa: Inerte!
Se a tarefa de um pároco é celebrar uma prece em busca de salvação,
A atitude de quem ama não poderia ser adversa,
Celebrar palavras que outrora são indigestas à razão,
Mas imprescindíveis em busca do conforto singelo da alma!
Se o silêncio é o símbolo do eterno,
Não poderei deixá-la nunca perecer na eternidade da ausência de palavras!
Cala-se quem procura enclausurar-se,
Mas nunca poderá silenciar,
Quem não teme a vida,
Quem não teme a cruz,
Quem não teme a dor,...
Jamais silenciará quem um dia
Almeja alcançar a felicidade,
Nada outorga indistintamente quem ama,
Apenas buscar uma incógnita felicidade
Quem merecer ser realmente feliz!
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário