A saudade não é um sentimento,
É a crucificação em vida de todas as dores sentidas,
Rascunhos mordazes martelando nas palmas das mãos,
A estaca plúmbea adentrando a carne.
A saudade transpassa todos os outros pulsares,
Marca com uma lança em brasa,
O registro indelével na derme,
Cozendo sangue e carne em letras disformes.
A saudade invadindo todos os poros da pele,
No despertar de uma noite sem sono,
Alguns feixes de luzes adentram ao quarto,
Povoando o cálice vazio da espera.
A saudade não apenas maltrata,
Ela massifica a dor em eclosão,
É um grito ardido num deserto gelado,
Um eco desesperado sem nenhuma receptividade.
A saudade não é chão. É puro barro,
Argila que faz a alma deslizar,
Areia movediça que engole os corpos,
A instabilidade que pulveriza a razão.
A saudade sorrateiramente eclipsa a alma,
Castiga os membros com tamanha paralisia,
Mãos, olhos e lábios incomunicáveis,
O sentido da dor maior em vida ausente.
No descompasso presente em cada coração,
A saudade se nutre com ares de perversão,
Todos os medos imagináveis e ainda não refletidos,
Invocando todos os demônios e liquefazendo qualquer tranqüilidade.
Os pesadelos inverossímeis são vivenciados como verdades provisórias,
A saudade contribui para criar um clima de desolação,
A ansiedade presente em cada silêncio,
O Purgatório que transcorre nos dias de abismo.
As boas lembranças torturam severamente,
Até as más memórias mudam de caráter na ausência,
Mutação de cores claras em tinturas fúnebres,
A saudade é como ácido deslizando livremente sobre a superfície da pele.
A saudade é um livro cheio de páginas a serem relidas,
Olhos cansados de tanto abatimento,
A abstinência do Amor conduz às mãos carregadas de vazio,
As inseguranças passam como um rolo compressor por todas as reentrâncias de dúvidas.
O coração pulsa amparado,
Atirado ao vento como papéis diante da janela,
Quando coração e papéis deixam de serem simples metáforas banais,
A saudade sofre a vã tentativa de ser incinerada sem qualquer lucidez ou piedade.
A saudade não é um trem que passa,
É o passageiro que desce e fica parado na estação,
A saudade permanece, permanece...
Fragmentada, atada e silenciosa.
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