sábado, 22 de novembro de 2008

Brumas Desérticas (Palavras Aprisionadas no Tempo)


De todas as palavras engaioladas,
As que mais causam sôfregas dores,
São aquelas registradas pela ausência,
Sem enfeitarem ou polirem os vocábulos.


Quanta ação é jogada fora,
Residindo intrinsecamente no verbo sentir,
Sensações suprimidas tão peremptoriamente,
A derrota corrosiva partilhada no vácuo.


Abro a janela e não sei o que pensar,
De uma aparência volátil com leve frescor e suavidade,
Logo vêm os pingos da chuva teimando em adentrar ao quarto,
Desfazendo toda a impressão inicial.


E aquela vontade de não sucumbir à dor?
Arquivada bem debaixo do travesseiro,
Na contabilidade do atalho narcíseo é mais fácil calar o silêncio,
Ao invés de erguer o hercúleo templo das palavras.


Lá fora não há nada: absolutamente nada!
Aqui dentro tampouco coexiste o desejo presente,
As brumas de tão densas servem para derrubarem as pontes,
E no limite, se encarregam de ocultar quem eu sou.


Seria o Destino implacável e mesquinho?
Maltrata e desarticula suas vítimas,
Relega à orfandade seus ingênuos reféns,
Resta então colocar a culpa nos deuses e suas indiferenças pagãs.


A tarde segue calada e fria em sua rotina cristalina,
O silêncio contamina o quarto como um febre terçã,
A sonoridade se emudeceu rapidamente,
E os lábios coçam na tentativa de emitir algum ruído.


Por mais que é refletida inadvertidamente,
Nenhuma idéia salta da parede com vigor,
Os fantasmas dos dias amargos batem o cartão de ponto,
A palavra castrada é a jaula hermética das incertezas.


O sono cai, o corpo desfalece e a escrita pesa,
A vida mimetiza a folha límpida do caderno,
A tinta desestimulada de registrar suas impressões,
O deserto se completa sem maiores surpresas.


Pensar e não realizar,
Pensar e nada poder atingir,
As palavras limitadas pelo papel,
As mãos aprisionadas sem ação.


Há dias que palavras e pensamentos se desvencilham,
Não se acham no mesmo espaço,
Como entidades abstratas biunívocas,
Enclausuradas em si mesmas.


Segue a vida,
Segue o corte,
Palpita o tempo,
Corrompe a liberdade.


Diante do horizonte mergulhado em sólidas nuvens,
O percurso é longo e as respostas são enigmáticas,
Com o suor salobro trilhando sobre a testa,
Na lida silenciosa pelo clarão dos seus olhos.


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