segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Quando Deus saiu de férias


Na noite de total penumbra,
Os dias seguem o curso negro
Como uma horda vociferante de morcegos hematófagos,
Deliberadamente atrozes e vorazes,
Buscando saciar até a última gota de sangue,
Como cães que ladram e lutam por um pedaço de pão molhado.
O silêncio é uma nódoa sem brilho.

Caído em uma poça de desencanto,
Cambaleado com as vis palavras,
O corpo é deixado como se estivesse num processo de evaporação,
Na calada da noite as adagas são fincadas no peito,
E novo silêncio açoita anunciando a abertura dos portais,
Quais os caminhos que são percorridos no vazio?
O abismo abraça todo aquele que desiste de sua própria alma...

Tenho escolha? - Pergunto-me a todo o momento.
Não ouço resposta!... E ainda haverá alguma resposta?
A temporada de caça às minhas convicções está aberta,
A cabeça pesa de forma incomensurável...

O silêncio do vagão é rompido,
Um senhor de óculos segurando ansiosamente uma Bíblia,
Recita freneticamente em paroquial alto som,
Que ninguém vem ao Pai sem desvencilhar da dor,
E quanta dor derramada!...

Dias, noites, madrugadas, primavera cinza...
Somente Mefisto maligno me acompanhou,
Se hoje sou um desconhecido,
Amanhã talvez a saudade lhe apunhale cortantemente...

Uma lágrima escorre pelo canto de um olhar insalubre,
E secam com o passar do tempo...
As mãos trêmulas e irrequietas são guardadas no bolso,
O corpo balança com o chacoalhar do trem.

A fé criou pó,
A luz vingou cruz,
A súplica virou dor,
A boca secou o beijo,
A voz marcou a alma,
Os pensamentos vigiam a esperança,
A paixão sacrificada foi negada,
Abafada com as vísceras expostas,
Agora, todos os fantasmas visitam o seu berço,
E meus olhos atônicos fazem vigília do lado de fora da redoma.
O temor que consome e nega
É a mesma angústia atroz que crucifica minhas pernas.

Deus saiu de férias!
Foi anunciado em folha de jornal.
Em qualquer cor é possível sentir sua ausência,
Ninguém ouve mais nenhum sopro de vento,
Olhos perdidos no escuro e passos sem rumo,
Os ventos chacoalham os galhos secos da existência,
Alguém fechou a porta...
E apagou a luz!...
Silêncio...

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