quarta-feira, 25 de julho de 2007

O roubo da esperança

Criança da Vila Recanto dos Pássaros, em Teresina (PI), vendendo peixe nas ruas.


Não quero a criança atada na guerra pela sobrevivência,
Na batalha canibalizada pelo pedaço de pão,
Juntando migalhas para o arroz e feijão,
Pedinte miserável entre becos imundos e faróis humilhantes.

Não quero a criança tísica,
Exaurida na labuta escrava amolecendo barro,
Pálida e extenuada erguida por pequeninos pés descalços,
Açoitada pela indiferença e ganância desmedidas dos homens.

Não quero a criança com as mãos estaladas,
Sentada no chão molhado das esquinas,
Oferecendo cinco dedos e súplicas de misericórdia,
Colhendo a lágrima seca que tanto ecoou em vão.

Não quero a criança nutrindo-se do lixo guerreado contra urubus,
Enclausurada em barracos esfacelados e domesticando ratos,
Ingerindo água podre e pisando em esgoto,
Habitat mais tétrico do que um bicho do mato.

Não quero a criança moribunda,
Atirada como lixo inorgânico na sarjeta putrefata,
Vociferando ódio e inalando cola,
Perambulando até cair exaurida de tamanha dor.

Não quero a criança assassina,
Raptada pelo vício e alistada pelo exército branco,
Manejando rifles e pistolas como brinquedos inocentes,
Brincando de matar com balas de chumbo.

Não quero a criança desfalecida,
Sem sopro de vida e conduza para a vil gaveta,
Colecionadora involuntária de enfermidades e fome permanente,
Sem direito a vida e a Paz.

Não quero um mundo cínico e caduco parindo a morte,
Que renegam seus próprios filhos sem nenhuma piedade,
Explorando a miséria e a angústia humana,
Um mundo surdo para os gritos alucinados de crianças em desespero.

Quero a criança com um sorriso na face,
Pulando e brilhando de alegria,
Sorriso banguela de ternura cativa,
Crianças de todas as cores.

Quero a criança desvelando a liberdade,
Unido as mãos num mundo sem barreiras de linha divisória ou credos,
Sem o culto de dores precoces vivendo num mundo que possibilite sonhar,
Acreditar na vida e no Amor.

Não quero lágrimas da criança deslizando em profunda chaga,
Silenciada brutalmente pelo desespero e aflição,
Não quero um mundo onde ceifa ferozmente as mãos em procissão,
O roubo de qualquer réstia de esperança.

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